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Hipermídia Revisão A questão da habitação tal como se apresenta hoje, especialmente no que concerne às populações de baixa renda, alcança um nível de complexidade jamais enfrentado. Profissionais de várias áreas têm sido desafiados a buscar soluções que reduzam um dos maiores problemas sociais existentes hoje no país. É notável a preocupação com esta área, visto que no Brasil a produção em massa da habitação social desde os anos 60 tem levado, por questões de custo, a uma padronização excessiva dos projetos sem levar em conta o lugar de implantação, quanto mais a cultura local de uma certa região. Tal fato tem levado à produção de espaços impessoais, condicionando os moradores a ter que introduzir modificações em suas moradias para torná-las personalizadas e adaptá-las às necessidades específicas de cada família. Tal situação justifica o interesse por pesquisas em avaliação pós-ocupação- APO, instrumental que tem se mostrado como uma das formas de realimentação de projetos, como esclarece trabalhos como o de Antônio Reis e Maria Cristina Lay (1994). Esta bibliografia procura demonstrar os objetivos e vantagens da APO enquanto uma alternativa metodológica para avaliação de desempenho de ambientes construídos analisando, através da realimentação, os erros e acertos encontrados no objeto de estudo avaliado, de acordo com a visão dos seus usuários. Mais especificamente, a APO surge no Brasil a partir do ano de 1984, utilizando diversas técnicas de pesquisa com o objetivo de avaliar o desempenho de ambientes construídos em uso, a partir das perspectivas de seus ocupantes. A APO tem como objetivo definir recomendações que minimizem os problemas detectados no ambiente submetido à avaliação, assim como utilizá-las para otimizar o desenvolvimento de futuros projetos. A referida avaliação de desempenho consiste do somatório de avaliações de diversos elementos de desempenho ambiental, as quais geralmente são separadas em físicas e comportamentais. As primeiras procuram avaliar os elementos de desempenho técnicos (conforto ambiental, materiais, infra-estrutura) e funcionais (acessibilidade, segurança, capacidade espacial, flexibilidade, ergonomia) através de métodos como levantamentos físicos e medições. As avaliações comportamentais procuram avaliar as atitudes e satisfação dos usuários em relação aos elementos avaliados, geralmente por meio de questionários, entrevistas e observações comportamentais. A aplicação de uma APO geralmente é caracterizada por dois tipos de investigação segundo seus objetivos específicos: os estudos de caso (onde apenas um ambiente construído é submetido à avaliação) e os estudos comparativos (entre dois ou mais ambientes construídos similares, representativos de seu universo). Uma critica apresentada no trabalho de Antônio Reis e Maria Cristina Lay (1994) refere-se ao fato de que o método de avaliação de desempenho de ambientes que se tem utilizado em várias pesquisas já realizadas não relaciona as avaliações físicas com as comportamentais. O ideal, segundo os autores, seria a avaliação de desempenho ambiental através da combinação de avaliações físicas e comportamentais, a qual estaria metodologicamente correta e completa para atingir os seus reais objetivos, como o de enfatizar a melhoria da qualidade de vida dos usuários através da otimização do desempenho ambiental. Juan Zapatel (1994), ao relatar aspectos discutidos com base no trabalho de Antônio Reis e Maria Cristina Lay (1994), faz algumas considerações sobre o papel do usuário nas avaliações de ambientes construídos. No caso específico da APO, a participação do usuário é vista em termos de levantamentos de informações a fim de avaliar-se o ambiente construído de modo a conhecer-se o grau de satisfação do usuário. Ressalta-se que em levantamentos como estes, devem ser consideradas na formulação de questionários, entrevistas e observações, algumas diferenças comuns como a situação econômica, aspectos sócio-culturais, dentre outros. A base teórica escolhida para a realização desta pesquisa em particular é fundamentada principalmente na pesquisa de Maria Lúcia Malard (1992), desenvolvida em tese de Doutorado, na Universidade de Sheffield, e também na posterior pesquisa de Maristela M. de Almeida (1995), que utiliza os princípios teóricos e metodológicos desenvolvidos por Malard em tese de Mestrado em Ergonomia, a qual tem como tema a análise das interações entre homem e ambiente. Através de estudo teórico a autora discute os métodos normalmente utilizados em análises de ambientes, a partir de colocações de alguns estudiosos do assunto. Por exemplo, segundo Orsntein (apud Almeida M., 1995) “na América Latina as pesquisas relativas as inter-relações entre ambiente e comportamento, e, mais especificamente à Avaliação Pós-Ocupação (APO), ainda se encontram, tanto do ponto de vista pragmático, quanto do ponto de vista teórico, aquém das necessidades dos usuários dos ambientes construídos”. A mesma coloca ainda que “o método da APO foi adaptado a nossa realidade, com características muito mais técnicas do que comportamentais. Isso ocorreu porque os pesquisadores brasileiros acreditavam que a problemática da avaliação no Brasil deveria enfocar os aspectos ou variáveis prioritários, ou seja, aqueles técnicos-construtivos, econômicos e funcionais (relativos ao espaço e ao conforto ambiental), antes de abranger fatores comportamentais ou psicológicos”. As citações acima procuram demonstrar que no Brasil, as APOs salientam principalmente os aspectos funcionais e técnicos dos edifícios. De acordo com Almeida (1995), alguns trabalhos já vêm sendo desenvolvidos com enfoques psicológicos ou sociológicos utilizando-se, porém, de técnicas oriundas destas áreas do conhecimento. Estes trabalhos geram resultados que normalmente são de difícil tradução em termos da linguagem arquitetônica e, portanto, dificilmente concretizáveis pelos arquitetos. Rabinowitz (apud Almeida, M. 1995) coloca a “falta de pesquisa avaliativa compreensível pelo arquiteto, e uma atitude da profissão que não leva à pesquisa” como entraves ao desenvolvimento das pesquisas na área. Conforme Almeida (1995) o que, em geral, parece ocorrer nestas pesquisas, é uma “inadequação entre os métodos utilizados e o tipo de informação buscada”. Recentemente, porém, estudos mais aprofundados sobre o ser humano e o ambiente construído em termos comportamentais e fenomenológicos tem propiciado novos subsídios ao universo da arquitetura, visto que pesquisas no campo da psicologia e das ciências sociais se mostram de difícil manipulação pelo profissional arquiteto. Merleau-Ponty afirma que “a fenomenologia aparece como uma tentativa de resolver um problema colocado no início do século pela crise da filosofia, das ciências sociais e das ciências em geral”. O mesmo a descreve como “a descrição plena e isenta da experiência”. (apud Almeida, M. 1994) Com base em autores como o acima citado, para Almeida (1995) parece adequado pensar em um método de análise das interações entre homem e ambiente apoiado na observação de fenômenos, uma vez que a abordagem fenomenológica permite compatibilizar as ciências do homem, tais como psicologia, sociologia, entre outras. Baseada em Stevens, a autora relaciona as principais características da abordagem fenomenológica, tais como:
O que importa para o profissional arquiteto é o levantamento de todas as informações sobre o objeto arquitetural, alcançadas de maneira que possam ser traduzidas no universo da arquitetura e que demonstrem o desvio entre as necessidades dos usuários e os elementos arquitetônicos ausentes ou mal providos. Não possui muita relevância se os dados colhidos são qualificados como físicos ou comportamentais, assim como enquadrá-los em algum contexto (histórico, cultural, econômico, etc), já que serão analisados em sua totalidade. Segundo Maristela M. de Almeida (1995), da mesma forma deve ser analisado o usuário, sem se preocupar em “dividi-lo” em suas esferas psíquica, física e emocional. Dentro deste contexto estudos de caso são importantes fontes de dados para identificar os conflitos existentes em ambientes, como por exemplo os habitacionais de cunho social, como já foi testado por Malard (1992). Neste trabalho Malard desenvolve um método de avaliação de desempenho de ambientes com abordagem fenomenológica denominado de Teoria dos Conflitos. O referido método foi utilizado com o intuito de averiguar os atributos essenciais que as casas populares necessitariam possuir para mediar o fenômeno “habitar”. Para tanto, Malard utilizou a abordagem fenomenológica, partindo da idéia de que o homem está interligado ao espaço, o qual é o espaço arquitetônico mediador da existência humana. Como o homem tem lugar no espaço e consequentemente habita o mundo, segundo Malard o fenômeno “habitar” estende-se em três dimensões, as quais seriam as características essenciais da habitação: interior/exterior, visibilidade e apropriação. Estas características relacionam-se a quatro fenômenos existenciais que revelam as necessidades humanas que devem ser consideradas quando se concebe um ambiente: ambiência, identidade, privacidade e territorialidade. Como o homem habita a casa, logo o objeto arquitetônico “casa” media o fenômeno “habitar”. (apud Almeida M., 1995) O método de Malard consiste em leituras espaciais que podem ser definidas como observações sistemáticas seguidas por descrições etnográficas. A expressão leitura espacial pode ser relacionada ao pensamento de Duncan de que o ambiente construído fala a linguagem dos objetos e pode ser abordado como um texto, passível de ser lido a fim de ser entendido e interpretado. (apud Almeida, M. 1995) Através das leituras espaciais, as quais são baseadas na observação direta das interações entre usuários e objetos arquiteturais, são identificados conflitos arquitetônicos. Estes são definidos como qualquer fato que decorra de um elemento arquitetônico quando da interação do usuário com o ambiente. É necessário mencionar que a ocorrência de um conflito está relacionada com a inadequação ou ausência deste elemento no objeto em estudo e, que cada elemento relaciona-se com fenômenos existenciais que definem o “habitar”. (apud Almeida, M. 1995) Estas leituras foram elaboradas com o propósito de serem utilizadas por arquitetos que tenham interesse em avaliar relações entre ambiente e comportamento, através de suas habilitações e poder de observação. O método, de acordo com Almeida (1995), consiste em pesquisas como a observação direta e sistemática, e entrevistas informais,. O registro destas informações ocorre através de anotações, fotografias, esquemas descritivos, entre outros, sendo que estes dados são interpretados através de uma posterior análise qualitativa. Na compreensão de Almeida (1995), a utilização do referencial teórico fundamentado na relação homem/espaço, a abordagem fenomenológica, a coerência e clareza metodológica, e o instrumental familiar aos arquitetos-pesquisadores, proporcionam o modo mais adequado para analisar a qualidade de edifícios do ponto de vista de sua habitabilidade. Juan Zapatel (1994), faz uma síntese sobre a noção da participação dos usuários na produção de ambientes construídos, no que tange a concepção, construção e uso destes ambientes. Segundo o autor, a participação do usuário no projeto é apoiada por profissionais que entendem somente ser possível produzir ambientes satisfatórios quando os usuários participam do processo produtivo. No mesmo relato, o autor destaca “a importância de se ampliar o estudo do universo participativo no ambiente construído, incluindo-se não somente aqueles referentes aos programas oficiais ou aos da indústria da construção, mas também daqueles da construção informal, tais como favelas e loteamentos clandestinos”. O autor coloca também que, em se tratando da elaboração de conjuntos habitacionais, existe uma certa dificuldade no tocante a confecção e definição de métodos de pesquisa que incluam a participação da população de classe baixa, levando-se em consideração que esta camada social encontra-se à margem do processo produtivo de programas oficiais. Contudo, a participação do usuário no projeto de habitação popular, esbarra também em questões práticas, tais como a falta de visualização volumétrica deste em entender plantas baixas, cortes, fachadas. A linguagem gráfica da arquitetura não conversa com a linguagem visual do leigo, gerando problemas de comunicação. Bibliografias como a de Carlos Leite de Souza e Henrique Del Nero (1995), expõem a idéia de que para ser compreendido, o profissional deve comunicar-se com os futuros usuários através de uma linguagem que seja visualmente espacial, de características simples e que contenham representações de elementos familiares (não simbólicos), como por exemplo modelos espaciais simples, maquetas em escala reduzida ou simulações em computador. A multimídia se mostra hoje, integrada à computação (conhecida então como hipermídia), como uma forma de apresentação de idéias, projetos ou informações que permite uma integração muito maior com o usuário, facilitando o entendimento por parte deste através da interação de imagens fixas ou em movimento, efeitos sonoros, textos, vídeo, animação, etc. Segundo Nat Gertler (1995) em livro referente ao assunto, atualmente há dúzias de pacotes de autoria diferentes, projetados para permitir a produção de uma apresentação hipermídia interativa completa. Tais softwares utilizam ferramentas com as quais é possível idealizar telas combinando gráficos, textos, imagens, animação, botões de interface e outros itens para facilitar a interação dos sistemas com o usuário. Estudos mais aprofundados sobre a aplicação da hipermídia em diversas áreas, inclusive a arquitetura, contém prognósticos otimistas a respeito das perspectivas dos produtos hipermídia para os próximos anos. Trabalhos como o de Geraldo Serra (1993), descrevem algumas das diversas aplicações possíveis da multimídia na arquitetura, que vão desde títulos hipermídia informativos e didáticos para uso nas escolas de Arquitetura e Urbanismo e tutoriais destinados a reciclagem e complementação de informações profissionais, até a aplicação direta dos recursos hipermídia nos edifícios e espaços públicos a partir de dispositivos de informação e orientação, sistemas automatizados de controle dos múltiplos sistemas que fazem parte das edificações e obras urbanas, etc. Segundo o trabalho anteriormente citado, a hipermídia é também capaz de contribuir para o aperfeiçoamento de avaliações de desempenho de ambientes, através da utilização de sistemas simples de interações com os usuários destes, nos quais se poderia obter respostas cotidianas sobre o funcionamento dos diversos aspectos de seu desempenho.
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