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Políticas

Novo Horizonte

 

RESULTADOS DE ANÁLISE QUANTO À

CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

NOVO HORIZONTE E O PROCESSO DE ERRADICAÇÃO DA VIA EXPRESSA

AO   C. H.  ABRAÃO

 

 

Fig.1 -  Localização

                           

Fig. 2 -  Identificação

 

 

BREVE HISTÓRICO

 

Segundo Peres (1994), a crise do padrão territorial desenvolvida a partir do anos 70 gerou e ampliou os impactos urbano-habitacionais existentes, tornando a problemática habitacional mais caótica com o aparecimento dos sem-teto pela segunda metade da década de 80. Esta situação desreguladora, e o processo de pauperização, segregação e periferização do trabalho, fazem parte deste segmento social  que constitui a verdadeira  "ponta do iceberg"  de uma complexa e vasta problemática urbana e habitacional da região conurbada de Florianópolis, e de certa forma revela o que tem ocorrido no país.

Em Santa Catarina seus estudos também revelam os impactos gerados pelo "modelo territorial baseado na alta concentração tecnológica, intensificação da sociedade urbano-industrial, expansão e generalização da rede viária ( modelo rodoviarista ), energética e de telecomunicações - SC como zona estratégica". Estes foram então alguns dos fatores que pesaram, levando muitas das pequenas cidades - que abandonados pela política agrícola e agrária não conseguiam mais se manter- a empurrar as pessoas que ali moravam para onde elas pudessem ter  mais "chance" de  obter além do trabalho, outros atendimentos como educação e saúde.

Qual seria o melhor lugar  para saciar estas necessidades senão a capital do estado, onde a expansão da estrutura urbana e o crescimento  do capital comercial, imobiliário e turístico  estavam aumentando rapidamente?. Consequentemente, esta "leva" de migrantes gerou uma outra camada social carente de toda espécie de serviços os "sem-teto", pessoas estas que venderam tudo o que possuíam para morar na "terra prometida" e como o já mercado especulativo imobiliário não as permitiu encontrar um lugar onde pudessem fazer seus lares, começaram a  ocupar as  terras  públicas e privadas  que estivessem vazias, mesmo sem qualquer tipo de infra-estrutura urbana.

            A região conurbada de Florianópolis denominada "Pasto do Gado", reflete estas condições marcadas pelas constantes ocupações decorridas das primeiras atuações do Estado no sentido de amenizar este déficit de moradias. Esta primeira atuação foi a implantação de um dos maiores conjuntos habitacionais de Santa Catarina naquele local - o Panorama- que, localizado  num enorme vazio urbano, atraiu muitas destas pessoas para ocuparem o seu entorno. Segundo o bolsista Alexandre Matiello em seu trabalho referente ao primeiro ano desta pesquisa (1996-1997), apoiando-se em PERES (op. cit.), a COHAB construiria mais blocos deste mesmo conjunto nesta região então vazia, como  não conseguiu logo, este espaço que a ela pertencia começou a ser ocupado por migrantes e pessoas da própria região que perderam seu espaço na cidade onde o mercado imobiliário é tão competitivo e injusto.

            Estas ocupações resultaram em assentamentos organizados pelos seus moradores que juntos lutaram constantemente para permanecerem no local, muitas foram as tentativas de remoção que atormentaram estas famílias e pessoas ligadas em defendê-las. Sendo que após tanto sofrimento embaixo de uma lona que os afligiam nos tórridos verões, além da falta de água, luz, esgoto e recolhimento de lixo, estes moradores começaram a provar que organizados entre eles e apoiadas por políticos,  estudantes,  professores e pessoas afins  poderiam ser respeitados e conseguirem o direito de ter um lar em condições mais dignas.

            As comunidades se firmaram como meios de  obtenção de uma nova vida se tornando cada vez mais ocupadas o que gerou um grande descontrole habitacional, e um certo desconforto para o Estado, que procurando transformar a capital num grande chamariz turístico recebia estas pessoas com um vergonhoso cartão de visitas, denunciante da não existência de uma política pública que pudesse amenizar a vida daqueles que ali sofriam.

 Necessitadas então de uma urgente intervenção, as comunidades Novo Horizonte, Chico Mendes, Nossa Senhora da Glória e Via Expressa seriam alvos de tentativas de modificação desta realidade se tornando um dos grandes passaportes para políticos que usavam suas propostas de melhorias como maneira de se elegerem. Muitos foram os que prometeram, mas, nada fizeram de concreto para resolver a situação existente (PERES, 1994).

            Cabe lembrar que dois são os problemas referentes à falta de moradias: um foi mencionado anteriormente, bem mais complexo carente de políticas públicas mais abrangentes em âmbito nacional, são  os fatores que levam as pessoas a saírem de suas cidades e o outro é resultante deste, depois de terem saído como recebê-las em  boas condições, ou seja, a criação de uma política habitacional  eficiente. Como esta grande reestruturação do sistema político não está nem um pouco em vias de se concretizar, só resta ao poder público das cidades tentar aplicar as suas próprias soluções para amenizar os problemas vividos por estas pessoas.

            Neste local estão sendo implementados no momento 2 modelos contraditórios de resolução pontual do problema, no que tange a uma política pública, são a REURBANIZAÇÃO - que se trata da colocação de infra-estrutura e serviços, bem como, melhoria das edificações existentes no próprio local,  além da regularização fundiária das mesmas, tornando-as parte do sistema formal de moradias- e a ERRADICAÇÃO - que se trata da retirada das pessoas do local ode estão com a consequentemente derrubada de suas moradias. Isto pode se dar pela simples retomada do  lugar pelo proprietário que se encontra no direito de ter seu terreno desocupado, sem retorno para estas pessoas que ficam à mercê do problema ou devido à ocupação de locais de risco como encostas, áreas alagadiças e beiras de vias de alta velocidade, as quais são relocadas para  lugares  onde não haja risco. Na maioria das vezes,  estes lugares estão longe da onde estavam inicialmente e desprovidos de muito serviços. Assim, foram definidas: as comunidades Novo Horizonte, Nossa Senhora da Glória e Chico Mendes vão passar pela reurbanização devido já à grande consolidação destas comunidades como parte real da cidade, sendo inviável por diversos fatores  a sua retirada. A comunidade da Via Expressa no entanto, por ter este caráter de ocupação -às margens de uma via de alta velocidade- ordenou sua retirada o que com certeza foi apressada pela ação privada da Associação Pró-desevolvimento da Via Expressa- AVEX- composta por donos de terrenos e empresários com interesse no local, que juntamente com órgãos públicos como a PMF, a CASAN, a CELESC e a COHAB  se organizaram para uma rápida  remoção. [1]

            Este trabalho portanto, além de deter-se   em estudar a comunidade Novo Horizonte, devido ao objetivo inicial da pesquisa , ampliou-se,  no entanto, ao estudo da ERRADICAÇÃO que aconteceu com os moradores da Via Expressa, fazendo um comparativo entre estas duas linhas de atuação do Estado. A primeira (reurbanização) proposta e executada pela PMF, e a segunda (erradicação) proposta pela AVEX em conjunto com a COHAB com colaboração da prefeitura na realização do trabalho de remoção.

A comunidade Novo Horizonte se configura como uma das mais fortes do local apesar de ser uma das menores. Isto se deve ao fato de algumas de suas lideranças serem bastante  resistentes ou apresentarem críticas e dúvidas à solução adotada pela prefeitura,  no que diz respeito às modificações. Pode-se notar isto quando a proposta realizada pela prefeitura, a qual está sendo implantada na comunidade Chico Mendes e Nossa Senhora da Glória que são bem maiores, não ser aceita, necessitando-se de diversos diálogos para que uma alternativa intermediária fosse escolhida.

Esta comunidade surgiu em torno dos anos de 1987-88, e segundo o último cadastro realizado pelo grupo da secretaria do bem estar social  possui 250  famílias, totalizando 1063 pessoas que residem em 202 casas sendo 44 cohabitações.  O cadastro revela ainda que 28% das casas estão num estado regular de conservação, e 18% em um estado ruim, havendo somente 5% de habitações em bom estado de conservação. Estes dados são de extrema importância pois, o planejamento de quais edificações ficarão como estão e quais serão refeitas depende de informações como estas. Outro dado obtido diz respeito à origem destas pessoas que ficou assim dividida: responsável por família do sexo masculino  natural da grande Florianópolis 34,86% , natural da região serrana 35,43%, responsável do sexo feminino natural da grande Florianópolis 36,89%, natural da região serrana 30,22%.  Saber de onde estas pessoas são oriundas se torna bastante interessante pelo fato dos seus costumes e tradições que acabam refletindo seu modo de viver e de se apropriar do espaço físico.

Dados bem recentes, como o incêndio ocorrido  em junho deste ano no local, revelam a periculosidade existente por causa das instalações de luz através de "rabichos" que agravadas pelo fato das casas ainda serem de madeira e bem próximas umas das outras quando muitas vezes não são coladas, alertando para uma definição mais rápida das modificações a serem feitas.

A  ocupação que se estende ao longo da BR - 282, neste trecho que costumeiramente chamou-se Via Expressa, deu-se pela falta de espaço nos  assentamentos vizinhos que não comportavam mais pessoas sobrando-lhes somente estas áreas pertencentes ao DNER que não eram ocupadas ainda por causa dos riscos.

 

 

  Fonte: Paulina Korc

Fig. 3 - Esta foto mostra a proximidade que estas pessoas viviam da Via Expressa, e o risco diário

 

Esta situação começou a chamar muito a atenção pela quantidade de barracos que passaram a fazer parte da mais nova paisagem da cidade, conferindo-lhe  um ar de abandono e desprezo por parte das  autoridades que também se sentiram incomodadas já que todos que tivessem acesso à Ilha pela via viam esta situação de calamidade passando  a formar uma imagem da capital diferente daquela desejada por seus governantes. Desta maneira, como foi explicado  anteriormente, a AVEX,  juntamente com  demais órgãos públicos, conseguiu a entrada de uma empresa gaúcha que se interessou em instalar um mega-empreendimento,  o Big Shopping, naquele local, necessitando então a retirada daquelas pessoas para a construção de vias marginais que permitissem o acesso ao empreendimento.

 

 

  Fonte : Paulina Korc

Fig. 4 - Aqui registrada como se constituíam  as casas e formas de lazer encontradas pelas crianças

 

            Objetivando um melhor entendimento sobre a trajetória destas famílias, utilizou-se como fonte imprescindível para a compreensão dos fatos o trabalho de conclusão de curso da assistente social e freira Paulina Korc, que com sua admirável colaboração fez parte desta caminhada onde acompanhou e ajudou de perto todas as pessoas em seus momentos de insegurança e esperança, aos quais  se submeteram, ao passarem por esta experiência. Estagiando na PMF - DAC, e morando no assentamento Novo Horizonte vizinho próximo da comunidade da Via Expressa, ela pode desenvolver um olhar mais crítico sobre as reivindicações dos moradores e as respostas dadas pela prefeitura, sabendo, portanto, mais do que ninguém dar sua contribuição para ambos os lados.

 

Fonte: Paulina Korc

Fig. 5 - Uma imagem das condições em que se encontravam

 

Sendo assim, seus relatos são de suma importância para o mais correto entendimento deste processo, o qual se desenvolveu e ainda está por se desenvolver. Segundo Korc, após tantas lutas contra a remoção os moradores da Via Expressa, organizaram-se para reivindicar melhores condições de vida, assim como  a AVEX  e seus  colaboradores que também se uniram para "limpar" as margens da via. A comunidade da Via Expressa passou a ser um grande impecilho. Então, o que até o momento não tinha solução, rapidamente foi "solucionado", o que mostra a grande força exercida pelo poder econômico, onde o lucro impera sobre os demais problemas, sendo que, para obtê-lo, se remove até mesmo famílias inteiras prometendo-lhes um lugar melhor.

            As primeiras medidas tomadas foram o cadastramento das 467 famílias, dividindo-as em setores por ordem alfabética. A remoção então começou a se efetuar na região na medida em que se tornava mais urgente a sua saída, não pelo risco de vida ser maior e sim pela necessidade de construção do acesso para o empreendimento.

 

 

Fonte: Paulina Korc

Fig. 6 - As casas completamente derrubadas para a remoção

 

 

Foto : Paulina Korc    

Fig. 7 - Pessoas ajudando na remoção          

 

Estas pessoas foram retiradas e transferidas para terrenos negociados com a Prefeitura de São José e de Palhoça, sendo que esta somente concordou se metade das residências construídas fossem reservadas para seus próprios sem teto.

            As casas foram então erguidas e logo após sua ocupação foram verificadas que algumas das pessoas acabaram se desfazendo da edificação e até voltando para os assentamentos devido à grande distância para os empregos que já possuíam quando moravam no Monte Cristo e à falta de vagas em creches e escolas da região para onde foram transferidas e  que se encontravam lotadas. Houve também casos de má fé onde pessoas oportunistas se prevaleceram desta ação, vendendo as edificações simplesmente como fonte geradora de renda.

            Outra opção foi apresentada  para as famílias que ainda estavam naquele trecho e que deveriam rapidamente sair. Primeiro, foi oferecido um financiamento de um lote que poderia estar em qualquer parte do estado, sendo que mais ou menos 60 famílias  aceitaram, as outras optaram por permanecer e aguardar em alojamentos provisórios até que um conjunto definitivo fosse construído em terreno doado pelo empreendedor, construído pela COHAB, e onde a PMF  faria a remoção destas pessoas.

 

Foto: Tânia Guedes de Araújo

Fig. 8 - Vista dos fundos dos alojamentos

 

            Rapidamente as famílias começaram a serem removidas para os chamados barracões, que foram primeiramente definidos por uma cobertura de lona e banheiros coletivos que pioravam a situação por causa da alta densidade. No entanto, muitos foram os que intervieram como o vereador Lázaro e a organização de moradores que orientados pelas assistentes sociais não deixaram que os alojamentos fossem  assim realizados. Foram então cobertos com telhas e cada unidade passou a ter o seu banheiro.

            Naquele momento de muitas expectativas,  as famílias se maravilhavam com a mudança pois a nova condição lhes permitiam mais conforto e higiene  (mesmo não sendo ainda o ideal). Era, portanto, um novo cenário um pouco mais digno do que os até então enfrentados por eles.

 

Foto: Tânia Guedes de Araújo

Fig. 9 - Vista da fachada principal

 

            Para que o bom funcionamento dos alojamentos acontecesse, foram escolhidos coordenadores para cada bloco que fariam valer as normas estabelecidas por eles próprios em reunião onde se formou o regimento interno, o qual visava garantir certas regras visando um bom convívio, já que a grande densidade provocada pela tipologia geminada assim necessitava.

            Não demorou muito tempo para que as reclamações surgissem, pois a promessa feita pelos empreendedores garantia que ao mesmo tempo em que se erguessem as paredes do Big Shop, o conjunto habitacional também seria erguido. Só que problemas como a definição da localização deste novo local, também tornou-se um grande entrave. Segundo os empresários, a nova moradia seria efetuada em terrenos muito longe do atual o que não alegrou a comunidade que, organizada, exigiu outra solução fosse tomada. Finalmente, com o terreno escolhido no bairro Abraão, que ficava bem mais perto. Outros problemas de ordem política acabaram atrasando a construção.

 Desta maneira, as famílias que deveriam ficar no máximo 6 meses ali permaneceram por três anos, vendo o Big ser totalmente concluído, inclusive com os acessos e eles ainda ali no mesmo local, sofrendo agora diversos problemas como, goteiras, entupimentos, enchentes, invasões de outras famílias, lixo por todos os lados, ratos, e problemas como inadimplência no pagamento dos talões de água e luz que foram motivos de muitas discussões. As brigas, portanto, passaram a ser constantes entre vizinhos, pois arrasados, cansados pela espera e descrentes de um futuro melhor, a falta de paciência começou  a imperar.

 

Foto: Tânia Guedes de Araújo

Fig. 10 - Vista do mega empreendimento contrastando com as moradias

 

            Finalmente após tantos sonhos desfeitos e falta de esperança, o tão esperado conjunto  habitacional foi edificado no bairro Abraão. O projeto foi elaborado pela COHAB, que segundo MATIELLO (ver também em PERES, 1994, cap. 6) sempre apresenta soluções que não respeitam o meio físico, realizando enormes movimentos de terra, porque a maioria dos seus projetos são carimbos efetuados em qualquer lugar do país, desconsiderando materiais encontrados no local, clima e tradições vindas destas famílias que normalmente são oriundas do interior.

 

Foto: Tania Guedes de Araujo

Fig.11- Vista da parte externa do novo conjunto

 

Para estas famílias no entanto, o deslumbramento da mudança não as deixa perceber que possíveis problemas de apropriação do lugar possam ocorrer, pois nunca moraram antes em apartamento, o qual tem uma relação com o solo onde se insere totalmente diferente de uma casa, o modelo o qual eles estão mais acostumados. Dentro deste tema CARVALHO ( 1985 ) desenvolve um estudo pós-ocupação onde analisa conjuntos habitacionais no Rio de Janeiro que embasaram a análise realizada por MATIELLO (1998) no conjunto Panorama. Onde as dimensões da habitação  que são as dimensões psico-social, sócio-econômica, sócio-cultural  e psico-cultural-econômica  garantem que estudos pós-ocupação possam adentrar um âmbito mais humanístico, trasncendendo o aspecto meramente técnico da análise. E que também será utilizado na realização da  análise do novo conjunto Abraão.

Outra análise resultante desta tipologia escolhida, pode ser feita por simples observação, pois  enquanto eles estavam morando nos alojamentos, já enfrentavam  problemas no pagamento dos talões. Como vão resolver isto agora que com certeza a taxa condominal será mais alta que antes? Outra questão indicada por Paulina, diz respeito à não-execução de lixeiras até que o projeto esteja totalmente concluído, o que já está gerando problemas, pois, sem lugar e sem muita consciência ecológica e de higiene, o lixo está sendo jogado em toda a parte. Isto deve ter uma solução rápida com a execução de lixeiras provisórias e orientação de como proceder com o lixo, horários de coleta e maneiras de juntá-lo.

            Uma observação interessante, segundo Paulina em seu relato à resposta dada para esta comunidade para tentar resolver o problema habitacional que teve muito mais interesse econômico  do que social, acabou ganhando  destaque nos meios internacionais e participação da Agenda XXl, pela brilhante atuação do meio privado na solução de um grave problema habitacional existente nas grandes cidades. Esta denúncia de Paulina revela o que os estudos realizados por PERES (1992), comprovou: a lógica econômica é que orienta estas ações.

 

Foto: Tania Guedes de Araujo

Fig. 13 - Vista frontal do novo conjunto

 

            Como estas pessoas se mudaram para o conjunto há poucos dias, muitos pontos ainda não puderam ser observados. Mas, no decorrer deste novo ano de pesquisa, e com certeza continuando o acompanhamento destas pessoas, muitas outras análises poderão acontecer.

            O que, no entanto, não pode ser dito é que a pesquisa chegou ao fim, seria incorrer num grave erro, porque o processo não pára no tempo, está em constante mudança e a resposta dada para esta comunidade dará ainda muitos subsídios para o constante aprendizado e possível colaboração desta bolsista no que diz respeito à pós-ocupação nosso tema neste meio.

 

 

RESULTADOS QUANTO À SINTESE INTERPRETATIVA DA PESQUISA NAS ÁREAS DE ESTUDO

 

1. Aspectos Gerais

 

O estudo de caso desta pesquisa deteve-se em estudar as linhas de atuação do Estado na promoção da regularização da ocupação do solo urbano que apresentava um grande número de habitações em locais perigosos e ou em condições subumanas, como a Via Expressa e a Novo Horizonte. Sendo estas duas linhas a erradicação e a reurbanização, as quais aconteceram respectivamente com estas comunidades.

Como já foi explicado anteriormente, este método foi utilizado para que a análise comparativa entre um conjunto habitacional oficial e os assentamentos irregulares que o cercam, que é o estudo de caso do projeto de pesquisa, pudesse ser melhor efetuada. Portanto, a renovação desta bolsa por mais um período seria extremamente importante para que se pudesse fazer o fechamento da pesquisa, ou seja, a análise e a proposta formal para a área.

Deixando claro que pretende-se fechar a pesquisa com diretrizes e propostas que servem para tentar solucionar os problemas detectados naquele dado momento da história, pois, a realidade não se congela é aliás como comprovamos durante a pesquisa é extremamente dinâmica. Caso contrário este trabalho jamais se concluiria pois a cada fato novo outras questões seriam apresentadas e novamente  ramificações do estudo surgiriam na tentativa de tentar desvendá-las.

Os resultados desta pesquisa podem ser divididos em :

·        RESULTADOS METODOLÓGICOS

·        RESULTADOS ANALÍTICOS

·        RESULTADOS SUBJETIVOS

 

 

2        RESULTADOS METODOLÓGICOS

 

Este tipo de resultado foi obtido através da aplicação com sucesso do método dialético da construção do saber, onde o desenvolvimento das atividades foram realizados de maneira a contribuir para o adequado entendimento dos fatos que produziram esta situação estudada pela pesquisa.

Isto se deu através das bibliografias indicadas ou procuradas, onde se construiu o pensar analítico, e indo a campo ao mesmo tempo vivenciar estes fatos pelas entrevistas aos moradores e às lideranças, onde se pode entrar um pouco neste mundo de miséria e insegurança que muitos nem sequer sonham que existe, detectando com esta  experiência  seus maiores problemas para que desta forma  se pudesse  elaborar propostas que conseguissem ser mais justas.

O resultado mais interessante deste método de pesquisa foi que ele acabou influenciando nos próprios objetivos iniciais, pois a cada visita novas situações eram encontradas e necessitavam ser estudadas provando a dinamicidade da realidade. Caso o método fosse: primeiro coletam-se os dados e passa-se dois anos estudando-os sem nunca mais voltar ao local, com certeza os objetivos iniciais seriam cumpridos, no entanto, para uma realidade que não existiria mais. Claro que estas mudanças devem ser consideradas até um certo ponto, dependendo de sua relevância para a pesquisa, pois, senão esta jamais teria fim.

 

 

3  RESULTADOS ANALÍTICOS

 

            Após todos estes dados serem obtidos, elaborou-se um dossiê que segue em anexo, onde conta-se  um pouco da história de como aconteceram  as ocupações. Ao se dizer um pouco, refere-se ao fato de que o objetivo desta pesquisa não era retomar esta parte que já foi muito bem pesquisada e apresentada por PERES (1994), em sua tese  de doutorado, mas sim situá-la no momento.

 Portanto, neste dossiê, existem quatro anexos onde no primeiro faz-se a caracterização do lugar, com seu histórico e uma primeira conclusão dos dois momentos vivenciados pela pesquisa neste quase dois anos. No segundo anexo juntaram-se todas as entrevistas  que foram relatadas, procurando  dar a mais fiel interpretação possível,  referentes ao primeiro e ao segundo momento da pesquisa.

 Ao mesmo tempo, realizou-se o levantamento fotográfico que teve o intuito de registrar em que condições se encontravam estas pessoas antes das modificações e depois quando começaram a viver as mudanças. No anexo três relatam-se todas as entrevistas realizadas com técnicos, como o arquiteto da COHAB, o arquiteto da PMF e a assistente social do DDS. O quarto anexo contém alguns dos fichamentos realizados para consulta.

É de fundamental importância deixar claro que a análise pós-ocupação para a verificação do funcionamento, adaptação e de apropriação do lugar,  só poderá  ser realizada na continuidade desta pesquisa, já que é muito recente esta modificação ocorrida.

Com relação as ações aplicadas, verificamos que as políticas adotadas para estas áreas são contraditórias apesar de acontecerem em lugares vizinhos, e de possuírem contribuição das mesmas instituições públicas. Provando que não existe uma política séria e organizada para a resolução da problemática habitacional. Pois ora aplicam a participação das comunidades na defesa de seus interesses e depois as impõem soluções que não vão conseguir resolver o problema. Isto foi comprovado pelas entrevistas que já mandaram avisar os moradores do novo conjunto Abraão que estão em débito com o pagamento das parcelas que vão ser despejados... que política é essa?

            Esta análise portanto revela que a erradicação aqui estudada não conseguiu resolver o problema enfrentando por aquela comunidade antes localizada na Via Expressa e que com certeza estas pessoas passaram por muito mais traumas de várias ordens os quais por mais defeitos que possam ser apontados no proposta da reurbanização não aconteceu com aquela comunidade.

 

 

4 RESULTADOS SUBJETIVOS

 

Muitas pessoas até mesmo alguns arquitetos acreditam que a função deste profissional na sociedade seria basicamente projetar e construir casas, edifícios ou qualquer outro tipo de empreendimento pelo qual recebessem muito bem em troca. Este tipo de pensamento diminui muito a capacidade delegada a uma pessoa que passa pelo menos 5 anos de sua vida nos bancos universitários para pensar o que é arquitetura. Caso fosse somente construir, projetar para quem pode pagar seriam meramente técnicos que não necessitariam de embasamentos teóricos para suas produções.

A função do arquiteto dentro da sociedade ainda mais num país de terceiro mundo onde a questão habitar se torna artigo de luxo e não uma necessidade básica, deve ir muito além, devem pensar como planejadores de cidades nesta questão que articula todas as demais.

Planejar habitações para a baixa renda  se torna um desafio ainda maior, onde muitos arquitetos que têm esta oportunidade acabam por desperdiçar a chance de proporcionar bons lugares para o desenvolvimento mais sadios de futuros cidadãos. Isto porque não é uma tarefa fácil, na medida em que a própria história acaba condicionando os profissionais a repetirem soluções "ditas econômicas" e de má qualidade, como se fossem as únicas.

Esta experiência proporcionada pela pesquisa nesta tema em questão mostra as várias  faces de um mesmo problema: como as pessoas vivem nos assentamentos, as pessoas que trabalham nos órgãos que intervêm nos assentamentos e as pessoas que estão de fora e podem analisar e contribuir com estes dois lados, ou seja, o pesquisador.

Ao entrar em contato com o local e seus moradores após as leituras relacionadas ao tema, pode-se entender muitas questões que outrora não se respondiam por simples observação do lugar, assim como surgiam outras que necessitavam de novas explicações teóricas. Tudo isso reforça a aplicação do método como vantajosa na apreensão dos conceitos a serem trabalhados, ou seja a simultaneidade de etapas. Estes contatos resultaram em muitas sensações que foram incorporadas ao pensamento da pesquisadora devido a todo o exercício desenvolvido tanto no sentido técnico científico quanto no engrandecimento pessoal.

O resultado das experiências pode-se então classificar como gerador de uma nova visão no que tange à real função do arquiteto como elemento modificador do espaço urbano tão culpado quanto qualquer outro ser humano que interfere no seu meio físico e, às vezes, mais culpado por ter a consciência do certo e errado e mesmo assim fechar os olhos por não ter coragem ou vontade de agir.

     

 

5  REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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BONDUKI, Nabil. “Origens da habitação social no Brasil”. São Paulo: Estação Liberdade, 1998.

CARVALHO, Thereza Christina Couto. "As dimensões da habitação". In: Projeto. São Paulo, n. 77. P . 95-103, julho de 1985.

KOWARICH, Lucio ( Org.). “Terra de habitação x  terra de espoliação”. São Paulo: Cortez, 1984.

KORC, Paulina . Às margens da "Via Expressa"; a prática de sujeitos coletivos   pelo direito social à moradia.  Florianópolis, 1997. TCC (Bacharelado em Serviço Social) - Departamento de Serviço Social- Universidade Federal de Santa Catarina.

LOWE, Márcia. "O planejamento das cidades". In : Qualidade de vida : Salve o Planeta.      São Paulo:  Globo, 1992.

PERES, Lino Fernando Bragança. Crisis de un patron de desarrolo territortial y su impacto urbano-habitacional en Brasil ( 1964-1992): La punta del iceberg: Los "sin -Techo"en la region de Florianópolis, SC.    Cidade Universitária, México, 1994. Tese  (Doctorado en Urbanismo) - División de Estudios de Posgrado - Faculdad de Arquitectura, Universidad Nacional Autonoma de Mexico - UNAM, 2v.

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SANCHES, L.E. “Os papéis de avaliação de impacto”. São Paulo : EDUSP, 1991.

SUGAI, Maria Inês. “As intervenções viárias e as transformações do espaço urbano: A via de contorno norte-ilha”. São Paulo, 1994. Dissertação (mestrado). Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.

VALLADARES, Lícia Prado (Org.). “Habitação em questão”. 2º ed Rio de Janeiro : Zahar Editores,1981.

VILLAÇA, Flávio. “Uso do solo urbano”. São Paulo: Fundação Prefeito Faria Lima/CEAM, 1978.

ZALUAR, Alba; ALVITO,Marcos (orgs.).”Um século de favela”. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio vargas,1998

 

[1] Estes dados foram encontrados na monografia KORC (1997)