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Políticas

Chico Mendes

 

ENTREVISTAS NO ASSENTAMENTO CHICO MENDES

 

Entrevista com a Professora de Serviço Social:

sobre método de abordagem de uma população carente

 

A abordagem para pesquisa em uma comunidade carente, requer algumas atitudes, que visam tanto permitir um trabalho com certa segurança quanto à precisão dos dados coletados, quanto à acessibilidade dentro de um espaço, a princípio totalmente diverso e com características que lhe são bem peculiares.

O primeiro passo para entrar numa comunidade carente, é tomar conhecimento de quem são os líderes comunitários e as pessoas de maior acesso á comunidade, como lideranças religiosas, bem como pessoas influentes da própria comunidade.

Estes são a porta da comunidade e estão por dentro das questões que envolvem toda ela, bem como  de sua história.

A partir disto, coleta-se o maior número de dados possível, com estas pessoas, procurando aliar-se a eles no sentido de desenvolver um estudo que também possa ficar com eles , além de complementar dados de pesquisa que possa lhes interessar:  isto abre as portas junto aos setores atuantes, no bairro, o que acaba por favorecer a pesquisa, uma vez que a partir disto, há a possibilidade da ajuda dos mesmos no desenvolvimento desta.

Na comunidade, o ideal é ser bem claro, na exposição do que é a   pesquisa e propor que eles fiquem com uma cópia do resultado final, para ajudá-los perante órgãos governamentais a defender seus interesses através de fundamentos acadêmicos  que venham a contribuir com propostas de seu interesse para a área.

Seria um trabalho que teria, portanto,  uma porta aberta para a cooperação da população.

O envolvimento de pessoas da comunidade na aplicação da pesquisa é importante, porque elas se sentem e tornam mais informal o caráter da entrevista, mesmo porque eles já são daquele meio.

A palavra-chave é: aliança....aliança com os meios envolvidos, buscando envolver cada setor em seu campo de interesses com vantagens para todos e um enriquecimento da pesquisa na cooperação mútua.

Outro fator que é importante é o uso de uma linguagem acessível.

Ouvir, observar e sentir são sempre mais importantes do que falar, sendo que uma palavra a mais pode fechar as portas.

Ir sem idéias pré-concebidas, reconhecer que aquele é um novo ambiente, com pessoas com visão de vida diferente da que temos, procurando entender suas relações e não julgando-as , a partir de um padrão já conhecido, é fundamental especialmente na fase de análise dos dados coletados.

 

 

Entrevista com líderes da comunidade...

(Jair e Antônio)

 

A ocupação do Chico Mendes se deu no início dos anos 80, durante a gestão do governador Bornhausen, quando Figueiredo era presidente da República.

O Sr. Antônio , vindo de Caçador, trabalhava em Lages , na indústria moveleira.

Veio para Florianópolis em 1990, durante a crise de emprego na cidade de origem, trabalhando aqui, atualmente, como vigia da empresa Reunidas.

 

Sobre o projeto...

Segundo ele, há 16 famílias em lugares de risco que serão transferidas para o projeto que , agora, está em fase de construção.

O projeto apresentado pela prefeitura é um conjunto habitacional horizontal de casas geminadas em dois pavimentos, com possibilidade de expansão vertical num terceiro pavimento , que ficaria por conta da família segundo suas necessidades.

Discutido com a liderança , em assembléias comunitárias, o projeto  tem sido motivo de conflitos entre idéias e interesses e limitações econômicas.

Um dos pontos mais discutidos é a questão da área de lazer:

o projeto está sendo implantado na única área livre daquela ocupação que era o campo de futebol.

Muita gente não aprovou a implantação do projeto ,por este motivo, sendo que a comunidade do Novo Horizonte não aceitou a proposta, ficando de fora do programa da prefeitura ( pelo menos, a princípio até nova discussão).

O projeto prevê 32 apartamentos no total , e atenderá às comunidades Nossa Senhora da Glória e Chico Mendes, sendo que , esta última, ficará com a maior parte das unidades, visto ser uma comunidade maior.

As remoções têm sido discutidas conjuntamente entre prefeitura e comunidade, sendo que uma das reclamações desta é que a equipe da prefeitura não entende os usos da comunidade.

Apesar de todas as preocupações levantadas pela comunidade, o que ali se conseguiu foi através da organização e reivindicação conjuntas.

A grande questão é: " O projeto é para baixa renda ou de baixa renda?" A população da comunidade terá realmente condições de ingressar neste conjunto, ou seu custo está muito além das condições financeiras da mesma?

E a questão da regularização da terra?

Há estudantes de direito dando assessoria à comunidade, cooperando na negociação da terra.

Tudo o que se consegue ali naquele bairro foi com muito esforço.

Se não fosse a organização da comunidade, nada teria sido feito e a população já teria sido removida. Em 1995, a intenção era de removê-la para o "Morro dos Cavalos"

Segundo eles, esta prefeitura desrespeita à população, atingindo direitos já alcançados pela comunidade.

Foi citado o corte da participação popular na decisão de peças orçamentárias, administrando o fundo de moradia.

"Atualmente não tem mais ninguém no fundo, que está sem liderança. A prefeitura não trabalha com o povo"  - afirmam Antônio e Jair.

 

Transporte...

O sistema de transporte urbano é muito satisfatório e eficiente, tanto pela freqüência , quanto pela qualidade do serviço.

A única questão levantada é o fato de os ônibus não entrarem na comunidade ,  e isto se deve ao fato de não estar regularizada ainda a situação da terra, bem como ao fato das ruas não estarem de acordo com as normas técnicas.

Da visão da população em relação à atuação da "Prefeitura" naquela área.

Para eles o Chico Mendes não deveria ser modificado.

O grande medo deles é a descaracterização e com isso, a possível transferência daquele espaço para população de outro estrato social, com a consseqüente saída deles para outro espaço.

A comunidade questiona a relocação dentro da atual área de ocupação:

Porque não usar a área livre atrás do BIG? ( este espaço a que se referem destinava-se à construção dos blocos restantes do conjunto Panorama, que segundo eles, não será levado à termo. Por que não usar este espaço ocioso para a implantação da tão sonhada casa isolada no lote?- este é seu questionamento...)

Segundo eles, ali caberia 600 casas isoladas que é a " moradia ideal" com que sonham.

Uma das principais reclamações deles, quanto à tipologia adotada pelos técnicos da prefeitura, é a falta de privacidade das casas geminadas. Além do que ,  a maioria gostaria que houvesse um pátio privado e não comunitário como será...`A tipologia adotada, eles comparam um pombal... ou como disseram também - " empilhamento de gente".

O problema não está tanto no fato das casas serem geminadas ( embora haja uma preferência muito clara pela casa isolada) mas na falta de um pátio individualizado para cada família.

Não há espaço livre dentro da comunidade e a utilização de sua única área de lazer, para a edificação desta primeira etapa do projeto, os desagrada.

 

 

Entrevista com equipe de técnicos da prefeitura...

 

A década de 80, foi caracterizada pela intensificação do êxodo rural que expulsou milhares de famílias, que abandonando o campo e os centros menores, vieram se  instalar principalmente na capital. A maior parte é proveniente dos municípios serranos, sobretudo Lages.

A expectativa era: emprego e melhor qualidade de vida....

Muitas vezes, esta população, que vem para cá , perde totalmente o vvínculo e os costumes do interior, preferindo viver aqui, e mesmo em condições precárias, sua condição  de vida é melhor que no interior.

Os que chegaram à Florianópolis a cerca de 10 anos teveraam maior facilidade para se estabelecerem e têm ,  hoje,  um padrão de vida melhor do que tinham antes...

Os que têm vindo, hoje para cá , não conseguem mais emprego e chegando aqui, exibem abatimento e desolação porque não encontram o que esperavam.

Segundo uma pesquisa feita pela Secretaria Social da prefeitura, as Favelas Chico Mendes, Nossa Senhora da Glória, e Novo Horizonte, se constituem nos principais redutos dos serranos, sendo que, só no Chico Mendes, perfazem 80% da população.

As três comunidades, juntas, possuem 4526 habitantes...

O programa  da prefeitura é por financiamento, sendo destinados 50 m2  para cada família.

Haverá maior espaço com menor acabamento, sendo que deste total oferecido ,  a prefeitura financia apenas 32m2.

Reclama-se da falta de organização comunitária do Chico Mendes, cuja liderança é vista como "centralizadoras", havendo muitos interesses individuais, que acabam prejudicando um consenso na aprovação do projeto.

Na Comunidade Nossa Senhora da Glória, percebe-se os mesmos interesses, e uma experiência na prática de participação comunitária.

Segundo eles , no Chico Mendes há uma grande rotatividade enquanto a outra comunidade, mais antiga, já se estabilizou. 20  a 30 %  da população do Chico Mendes - originários do planalto serrano - vão e voltam para o interior.

 

 Proposta...

A proposta de melhorias em termos de espaço é complicada , tendo em vista, a exiguidade de espaço, densamente ocupado , sendo necessária a implantação em etapas , com remanejamento da população.

Em termos técnicos, será utilizado o bloco de cimento estrutural, o que viabiliza em termos de custo, o projeto.

As casas, a princípio, todas iguais seriam diferenciadas individualmente na fase de acabamento, pelas cores. Além disto, a topografia do terreno, que é uma encosta, colabora para criar um movimento nas fachadas.

Quanto à questão da área de lazer, procurou-se negociar os espaços de lazer em troca de área construída.

Aos poucos,  tem se desenvolvido o processo de discussão comunitária e apesar das dificuldades, tem-se tido êxito.

A grande dificuldade sentida se dá a nível de comunicação da proposta, o que mesmo com a representação gráfica, não tem ficado esclarecido.

O projeto de participação comunitária e organização social tem colaborado, neste sentido, visto que há um acompanhamento constante. Por outro lado, esta é também uma exigência do programa Habitar Brasil -BID  para o financiamento do projeto.

 

Qualidade das habitações...

Como as casas são em fita, procurou-se adotar a ventilação  cruzada. Uma das preocupações tem sido a qualidade das aberturas e janelas, optando-se por uma qualidade inferior de alguns acabamentos e melhor conforto, pelo investimento a mais em outros, que julgam serem mais importantes .

O interior assim, ficaria por conta de cada um.

A proposta discutida em conjunto   foi, no aspecto urbanístico, conceitos e idéias de partido geral, não havendo discussão o modelo da unidade.

Para a área comunitária, foi traçado o programa de necessidades em conjunto com a comunidade.

A adoção da casa multifamiliar, seria a melhor forma de ocupação do espaço, havendo a preocupação em diminuir conflitos e oferecer conforto através da colocação de uma escada para cada dois apartamentos, diminuindo os custos de manutenção , sem despesa de condomínio.

 Uma inovação, a nível de produção de moradia para classe baixa, é a auto-sustentação do projeto: para evitar deterioração do espaço e controlar a especulação, tem se feito uma espécie de poupança comunitária para haver um investimento contínuo na área.

 

Dificuldades...

Resumem-se em  : 

"Defender as idéias e implantar propostas..."

 

 

Entrevista com arquiteto da COHAB.

 

 A situação da comunidade Via Expressa é de uma ocupação irregular de área pública, pertencente à COHAB. Assim, durante muito tempo, este órgão recorreu pela retomada da terra, que se destinava, inicialmente à construção de novos blocos do Conjunto de Habitação Popular Panorama.

Tendo sido constatada a consolidação da ocupação , depois de muito tempo de discussão, a COHAB,  desenvolve um projeto de habitação popular, com vistas à regularização daquela comunidade. 

Havendo por parte do hipermercado BIG SHOP, da rede se supermercados REAL do Rio Grande do Sul  ,  interesse por aquele espaço para construção de um outro acesso aos serviços que oferece, negociou a troca daquele pedaço de terra por um outro terreno no Abraão , onde o projeto que , então, se tem conhecido está sendo implantado.

A COHAB, que já tinha interesse em ocupar aquela área com um conjunto habitacional, com o objetivo de resolver a situação irregular daquela população, havia projetado um conjunto que apenas foi "deslocado",  uma vez que em nada o projeto não sofreu alterações  em sua transferência para o novo terreno.

O conjunto consta de 180 apartamentos,  distribuídos em 18 blocos de 3 pavimentos, sendo sua acessibilidade feita através da Via Expressa.

 Há uma área comunitária em cada um deles, no térreo , e uma área de estacionamentos, pois entende-se que as famílias, mesmo pobres, tenham o seu veículo.

O acesso ao apartamento será feito através de uma entrevista para triagem, uma vez que não se pretende aplicar investimentos a fundo perdido, escolhendo-se assim aqueles que se comprometem a pagar, ainda que em numerosas prestações , o valor do apartamento.

Neste tipo de projeto , bem pouco se considera a estética, implantação , insolação e conforto ambiental, mas prioriza-se a economia.

Assim, não houve por exemplo a preocupação com a insolação dos blocos.

Por este mesmo motivo,   cada apartamento , consta  de um mínimo de 32 m2, com um banheiro, sendo que as divisões ficam a encargo do próprio morador.

Aliás, isto também foi em consenso com os moradores que preferem dividir o apartamento segundo as necessidades e adaptações de cada família.

A área ocupada pelos moradores do  BIG SHOP, atualmente é faixa não-edificante, o que  também se dá na  Via Expressa...

Como garantir a fixação destes moradores no conjunto, evitando que os mesmos acabem usando-o como meios de incrementar sua renda em tempos de crise,  vendendo-o e voltando à ocupação irregular?

 Não há como  garantir , uma vez que o problema tem raízes também de caráter estrutural , na inserção desta população na questão urbana.

Eles constituem mão-de-obra barata, desqualificada e sem acesso a um emprego fixo . Seu assalariamento é irregular, sendo que vivem , muitas vezes de " bicos" ou "biscates".

O governo não assegura emprego, e portanto n~/ao há como absorver esta mão-de-obra.

Assim, não há como garantir que os mesmos permaneçam no local , evitando que um novo ciclo de ocupação irregular se inicie, o que impediria em absoluto , a solução da questão habitacional urbana.

Dessa maneira, toda e qualquer tentativa, seria apenas paliativa, temporária e muito mais no sentido de desocupação a curto prazo de áreas de interesse econômico, do que a busca de uma solução do problema habitacional.

Num contexto conceitual, o arquiteto coloca-se a favor da erradicação sem ter a preocupação de manter a população na área de origem, pois argumenta que a população tem condições de pegar ônibus para ir até seu emprego.

Não vê como necessidade, a mesma estar próxima ao trabalho, nem justifica a ocupação de áreas centrais, de vocação diversa, por esta população como justificativa.

É possível, segundo ele, oferecer moradias distantes do trabalho, mas com a garantia de transporte.